ANSOL no Parlamento Europeu

Na passada semana (mesmo antes da FOSDEM 2025), a ANSOL esteve novamente presente em Bruxelas, e aproveitou para reunir com alguns Deputados do Parlamento Europeu, que representam o nosso país na sede da União Europeia. Entre os dias 29 e 31 de Janeiro de 2025, dois membros da direção da ANSOL participaram nos seguintes encontros:

Deputado(a) Grupo Político no Parlamento Europeu Grupo Político em Portugal
Ana Vasconcelos Grupo Renew Europe IL - Iniciativa Liberal
Bruno Gonçalves* Grupo da Aliança Progressista dos Socialistas e Democratas no Parlamento Europeu PS - Partido Socialista
Catarina Martins Grupo da Esquerda no Parlamento Europeu - GUE/NGL BE - Bloco de Esquerda
Hélder Sousa Silva* Grupo do Partido Popular Europeu (Democratas-Cristãos) PSD - Partido Social Democrata
João Oliveira Grupo da Esquerda no Parlamento Europeu - GUE/NGL PCP - Partido Comunista Português
Sebastião Bugalho* Grupo do Partido Popular Europeu (Democratas-Cristãos) PSD - Partido Social Democrata
Sérgio Humberto* Grupo do Partido Popular Europeu (Democratas-Cristãos) PSD - Partido Social Democrata

* representado pelo(a) assistente

As reuniões tiveram como objetivos estreitar relações e relembrar as nossas preocupações e campanhas. Estas conversas foram bastante positivas, e esperamos continuar a promover a colaboração futura e sempre que os temas envolvidos sejam relevantes para o Software Livre.

Deixamos aqui um resumo dos temas que levámos connosco a Bruxelas:


Dinheiro público? Código público!

As soluções tecnológicas desenvolvidas com dinheiro público, deveriam ser também elas públicas.

A situação atual promove o desperdício de fundos e investimento público, promove a obsolescência por incapacidade de manutenção e não permite assentar em projetos presentes para um maior crescimento futuro.

Entendemos no entanto que mudanças drásticas ao paradigma atual dificulte a adoção e consequente melhoria dos processos em causa. Com base nestes pressupostos, sugerimos que seja implementada uma diretiva ao nível da União Europeia que obrigue a que os concursos públicos têm que publicar abertamente as soluções tecnológicas desenvolvidas (seguindo as 4 liberdades do Software Livre).

Esta simples alteração promove:

  • melhor alocação de recursos (através do reaproveitamento e adaptação a fins não previstos no âmbito inicial),
  • melhoria contínua das soluções existentes,
  • mais facilidade de manutenção ao longo do tempo através da utilização de tecnologias públicas e abertas de conhecimento distribuído (contrastando com uma solução proprietária e com documentação privada),
  • estimulação de uma concorrência mais justa
  • avanço para a soberania digital.

links:

CSA Regulation e Chat Control

O Child Sexual Abuse Regulation (CSAR) tem um objetivo inequivocamente crítico e importante: a proteção da nossa sociedade, em especial os menores. Ninguém tem dúvida que a agressão sexual é um ato horrível e que todos devemos combater. No entanto a iniciativa Chat Control é inequivocamente a opção errada para atingir este objetivo. Sabemos que a posição do parlamento é sensata, mas tem sido debatido no Conselho da União Europeia uma proposta de lei que vai contra os direitos fundamentais individuais (privacidade) e pouco ou nada faz para combater as atrocidades em causa.

Nomeadamente, não podemos aceitar as propostas em cima da mesa pelos seguintes motivos:

  • qualquer tipo de análise (local ou não) de conversas privadas é um atentado direto a um dos direitos fundamentais individuais e também à própria democracia em si,
  • sabe-se que a tecnologia a usar não é robusta, tendo uma alta taxa de falsos positivos. E como consequência, qualquer um de nós pode ser acusado de ser um agressor sexual (de crianças) sem ter feito nada de errado. Além disso, a possível existência de uma forma de quebra de privacidade e/ou sigilo é uma arma, se quando for usado nas mãos erradas (é inevitável que uma brecha existente seja explorada),
  • impacto no desenvolvimento de jovens (que alegamos querer proteger)
  • impacto no sigilo profissional
  • não devemos desperdiçar os nossos recursos em métodos que sabemos que são ineficazes e prejudiciais para aqueles que estamos a tentar proteger.

Existem no entanto sugestões alternativas que visam atacar o problema de uma forma estrutural e com maior probabilidade de sucesso (sem delapidar as fundações de uma sociedade democrática):

  1. Educação, consciencialização e capacitação das vítimas,
  2. Mudanças sociais e estruturais (eg: combate à pobreza),
  3. Reestruturar a polícia e outras instituições,
  4. Investir nas linhas de apoio,
  5. Aplicar a legislação já em vigor (a Diretiva 2011/93/EU obriga os Estados-Membros a tomar mais medidas para endereçar o abuso sexual de menores a nível nacional. Esta diretiva não foi implementada na sua totalidade apesar de estar em vigor há 11 anos),
  6. Prevenção,
  7. Trabalhar em conjunto com outras associações/instituições para proteger as crianças e todos os direitos fundamentais.

Reiteramos a necessidade e importância de votar contra qualquer tipo de medida que ponha em causa o direito à privacidade e à própria democracia.

Links:

DRM

O DRM (Digital Rights Management) é um conjunto de tecnologias e políticas projetadas para controlar e proteger os direitos autorais de conteúdo digital, como música, filmes, livros e software. Os autores devem ser pagos como qualquer trabalhador, e a pirataria é uma realidade que deve ser combatida. Infelizmente, o DRM acaba por demonstrar uma eficácia muito reduzida face à pirataria, trazendo problemas e dificuldades acrescidas ao direito de utilização dessas obras para os efeitos previstos na lei.

Por outro lado, a legislação portuguesa é um exemplo a ter em conta, pois identifica como DRM as proteções contra atos não previstos na lei, o que abriga a quebra legal dos mecanismos de proteção, quando usados para fins legais.

A nossa sugestão passa por identificar a necessidade de uma definição mais precisa do DRM, com enquadramento legal e tecnológico para as exceções previstas na lei. Tal definição deverá permitir o desenvolvimento de soluções de software (aberto) que permita a utilização das obras adquiridas para todos os fins legais previstos na lei.

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RNID - Regulamento Nacional de Interoperabilidade Digital

O direito de acesso aos documentos digitais públicos, por qualquer cidadão, é fundamental. Não é admissível que seja necessário instalar um software proprietário (e muitas vezes pago) para aceder a um conteúdo público.

Em Portugal foi aprovada uma lei que obriga entidades ou serviços públicos à disponibilização de ditos documentos em formatos abertos. Tal medida foi elogiada por toda a Europa (e mundo).

Infelizmente essa realidade não é igual em toda a União Europeia. Além disso, apesar da lei obrigar a disponibilização de documentos em formatos abertos, não existem nenhum mecanismo que garanta a aplicação dessa lei, havendo vários casos de incumprimento que estão por corrigir há vários anos.

Sugerimos duas iniciativas:

  • Uma recomendação ao Conselho da União Europeia (ao abrigo da regra 47) para que seja criada uma proposta para a União Europeia que vise a obrigatoriedade da disponibilização de documentos em formatos com normas abertas para todos os serviços ou entidades públicas.
  • Uma recomendação ao governo português acerca da necessidade de fiscalizar e auxiliar no cumprimento da lei, e aplicar prazos para correção das mesmas.

Links:

Redes sociais interoperáveis

A necessidade da presença digital de órgãos e instituições públicas junto da sociedade é fundamental. No entanto, a maioria das vezes são usadas soluções proprietárias, que requerem quase sempre uma conta e/ou aceitação de termos e condições, que não está alinhado com a liberdade individual.

Seria desejável que entidades públicas pudessem chegar à sociedade através de meios, tecnologias e plataformas abertas e operáveis, respeitando as liberdades individuais e promovendo uma soberania digital de forma ética.

O projeto fedigov.pt sugere a criação de instâncias federadas, geridas por instituições públicas, que permitam o livre acesso à comunicação, sem a manipulação e controlo das plataformas geridas (de forma pouco transparente) por terceiros. Seria interessante ver este assunto discutido no seio da União Europeia.

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